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Introdução

A Fundação Japão é uma instituição de intercâmbio cultural, estabelecida em 1972 com o objetivo de promover a compreensão internacional por meio do intercâmbio cultural. A fundação é atuante numa ampla gama de áreas, como na supervisão de projetos de intercâmbio cultural e artístico, na promoção do ensino da língua japonesa no exterior, e incentivando o diálogo por meio dos estudos japoneses e intercâmbio intelectural.

Como parte de nosso programa de intercâmbio artístico e cultural, temos o prazer de apresentar a exposição itinerante mundial intitulada Mangá Hokusai Mangá: Abordando o Compêndio do Mestre sob a Perspectiva dos Quadrinhos Contemporâneos. Atualmente, mais de 200 anos depois da publicação do primeiro volume de Hokusai Manga, as ricas expressões visuais criadas por Katsushika Hokusai e outros artistas da época continuam a nos encantar. Introduzindo algumas semelhanças e diferenças entre os mangás japoneses modernos, que hoje em dia desfrutam de uma popularidade mundial, e o mangá de Hokusai, esta exposição põe em evidência os atrativos dessa vertente original da cultura japonesa. Um dos destaques da exposição prometem ser as novas obras do grupo de sete artistas contemporâneos de mangá, baseadas em Hokusai e seu mangá. Repletas de imaginação descontraída, essas obras nos oferecem uma percepção das expressões sempre em evolução dos mangás.

Apesar do mangá ter sido frequentemente visto como entretenimento, em anos recentes, tanto na literatura como na arte, a mídia vem atraindo interesse como tema de pequisa e de crítica. Esperamos que, por meio desta exposição, os visitantes possam usufruir de maneira especial o prazer que o mangá proporciona.

Finalmente, gostaríamos de expressar nosso mais sincero agradecimento a todos os artistas e outros que aceitaram participar desta exposição. Queremos também estender nossa sincera gratidão à diretora dessa exposição, Jaqueline Berndt, aos curadores Yū Itō e Mizuki Takahashi, ao diretor de arte Shin Sobue, e às inúmeras outras pessoas que nos ofereceram apoio e assistência para a realização deste evento.

Fundação Japão

 

Desenhando, Lendo, Compartilhando: Um guia para a Exposição Mangá Hokusai Mangá

Jaqueline Berndt

Prefácio

À luz das histórias em quadrinhos japonesas contemporâneas e de sua proliferação global, Hokusai Manga do século 19 vem atraindo um interesse crescente. Os fãs do mundo inteiro tendem mesmo a considerar esse compêndio pictórico do artista de ukiyo-e Katsushika Hokusai como a origem do mangá atual. Mas a aparência externa desses dois tipos de mangá não sugere imediatamente uma tradição contínua. Será que as narrativas gráficas atuais e os “desenhos diversos” do mestre compartilham algo além do nome? Ao contrário das exposições anteriores da obra de Hokusai, Manga Hokusai Manga aborda os Hokusai Manga a partir da perspectiva dos quadrinhos japoneses atuais, focando no estilo, na narrativa pictórica e na cultura participativa, mais do que na integração da palavra e da imagem ou do papel dos personagens populares. E em vez de visar uma constatação historiográfica de influências, a exposição convida os visitantes a refletir sobre suas noções a respeito de mangás, ao comparar as obras de diferentes épocas enquanto exploram a diversidade existente nelas.

 

Notas

As páginas dos mangás contemporâneos devem ser lidas da direita para a esquerda e de cima para baixo, como nos textos japoneses e em muitas pinturas tradicionais. A exposição Mangá Hokusai Mangá tenta igualar esta direção de leitura na concepção da mostra adotando deliberadamente a contradição ocasional com a ordem de esquerda para a direita das legendas que evocam as edições traduzidas das narrativas de mangá.

A romanização das palavras japonesas segue o sistema Hepburn modificado, a menos que os artistas e outros detentores dos direitos tenham insistido numa grafia diferente. Os nomes japoneses aparecem na ordem adotada no Japão — sobrenomes precedendo os nomes sem separação por vírgulas — exceto quando os detentores dos direitos autorais preferirem a ordem em inglês. Para os nomes em escrita japonesa, veja a Lista de Obras Expostas, no apêndice.

Observe também que os títulos japoneses das partes da exposição não pretendem ter sido traduzidos literalmente.

O texto abaixo oferece explicações para a maioria da exposição, cada qual indicado pelos seus números da legenda. Neste guia, esses números nem sempre seguem a ordem de seu aparecimento nos painéis da exposição devido às divergências entre conceito e desenho. Embora aqueles tenham objetivado priorizar o mangá como material contemporâneo de leitura, estes enfatizaram os valores visuais e a tradição, colocando invariavelmente o antigo (ou seja, as obras de ukiyo-e) antes do novo (isto é, os quadrinhos).

 

Começando no Centro

No título da exposição, “Hokusai” ocupa o centro, posicionado entre os dois tipos de “mangá”. Um dos mais versáteis e inovadores ilustradores-pintores do seu tempo, Katsushika Hokusai (1760-1849) ganhou notoriedade na Europa e na América do Norte no final do século 19 começando por seu Manga. Ampliando o alcance de ukiyo-e (“pinturas do mundo flutuante”), ele retratava cortesãs e atores de teatro, publicava séries de paisagens, ilustrava histórias divertidas, e até mesmo realizava espetáculos de pinturas. Sua obra mais popular e conhecida é A Grande Onda (ou Sob a Onda ao largo de Kanagawa, Kanagawa oki namiura) [No 3], que foi lançada como a 21ª gravura de sua série Trinta e seis Vistas do Monte Fuji (Fugaku sanjū rokkei, 1830-33). Representada de um ponto de vista extremamente baixo, uma onda gigante entra na pintura se deslocando da esquerda para a direita, ou seja, numa forma contrária à convenção, incluindo a da direção japonesa de leitura. A própria imagem era extraordinária no seu tempo em termos tanto do mar como tema quanto do uso da recém-importada cor azul, Berlim ou prussiana. Em contraste, a segunda gravura da série apresenta o Monte Fuji emoldurado pelos telhados e pelo portão de uma loja de departamentos extremamente popular, situada perto do Castelo de Edo [No 1]. As faixas da loja anunciam, entre outras coisas “Somente Pagamento em Dinheiro”. Peregrinos escalando o Monte Fuji e fazendo orações na borda de sua cratera são o tema do que se pensava ser a última gravura da série [No 2]. Ela atesta o aspecto informativo do ukiyo-e, nos permitindo vislumbrar o culto de devoção totalmente masculino que floresceu no tempo de Hokusai.