2. Semelhanças entre os mukashi banashi e os contos ocidentais. Classificação dos mukashi banashi japoneses

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A partir dos conceitos que foram apresentados, é possível estabelecer paralelos entre os gêneros ocidentais e os mukashi banashi, como podemos visualizar na tabela que segue. Normalmente, quando nos referimos aos mukashi banashi, a terminologia mais utilizada é a de conto maravilhoso, visto que no folclore japonês não existem fadas.

 

 

No Japão, o maior estudioso dos mukashi banashi foi Yanagita Kunio, antropólogo que realizou uma vasta pesquisa acerca das histórias e costumes do povo japonês, abrangendo desde aspectos tradicionais, como os festivais, até hábitos e elementos do cotidiano, como moradia e alimentação. Estendendo seus estudos à literatura popular, propôs uma categorização para os mukashi banashi que é considerada a mais difundida no Japão; segundo ele, tais narrativas encontram-se divididas em três categorias e, cada uma destas, em várias subcategorias:

 

1. Dôbutsu mukashi banashi (literalmente, “mukashi banashi sobre animais”)

1.1. narrativas sobre a origem e hábitos de animais

1.2. narrativas sobre conflitos entre animais

 

2. Honkaku mukashi banashi (literalmente, “mukashi banashi primitivos”)

2.1. narrativas sobre casamentos entre seres diferentes

2.2. narrativas sobre nascimentos / casamentos

2.3. narrativas sobre casamentos / lutas (competições)

2.3.1. histórias sobre madrastas: o antagonista é a madrasta

2.3.2. histórias sobre irmãos

2.4. narrativas que se referem à obtenção de alguma fortuna

2.4.1.contos dos velhos vizinhos

2.4.2. contos sobre a obtenção de alguma fortuna proveniente de forças maléficas

2.5. narrativas centradas em batalhas contra bakemono / fuga

2.6. narrativas sobre agradecimentos de animais: muitas delas são tidas como lendas (densetsu)

 

3. Waraibanashi (literalmente, “histórias para rir”)

3.1. narrativas que discorrem sobre alguma alegria inesperada

3.2. narrativas centradas em uma personagem astuta

3.3. narrativas que tratam de personagens cômicas

3.4. narrativas sobre competições de habilidades

3.5. narrativas sobre duelos de sabedoria

3.6. narrativas centradas em uma personagem estúpida

 

Consideremos, a título de exemplo, alguns mukashi banashi para elucidar a classificação apresentada.

 

Issunbôshi (“Issunbôshi”)

Seu protagonista assemelha-se aos dos contos “O Pequeno Polegar” e “Polegarzinho”, dos Irmãos Grimm. Sua classificação principal seria a de número 2, honkaku mukashi banashi (mukashi banashi primitivos), subcategoria 2.2. (narrativa sobre nascimentos). Isso porque Issunbôshi é uma criança de nascimento miraculoso, pois nasce a partir das preces de um casal de velhos que não podia ter filhos. Dependendo da variante do conto, o nascimento acontece de forma extraordinária: em uma versão, sua mãe passa por uma gestação de dez meses; em outra, a criança nasce de uma inflamação do dedo polegar da mãe. Cabe aqui afirmar que boa parte dos mukashi banashi japoneses apresenta uma versão em cada província do país, muitas delas diferindo-se entre si: às vezes em alguns detalhes em particular, outras em relação ao próprio desenvolvimento do enredo.

Diversas outras narrativas bastante conhecidas no Japão pertencem a essa classificação, como Momotarô (“O Menino Pêssego”, criança de força descomunal que nasce de dentro de um pêssego), Kaguya Hime (“A Princesa Kaguya”, menina que surge de dentro de um bambu) e Kintarô (“Kintarô”), dentre outros.

 

Momotarō e os três animais. Ilustração do livro Ehon takara nanakusa, de Kyōden Santō (1761-1816), 1804. Fonte: National Diet Library Japan

 

Kobutori Jiisan (“O Velhinho Com o Quisto”)

Trata-se de um honkaku mukashi banashi, de subcategoria 2.4.1. (contos dos velhos vizinhos). Há diversas outras narrativas no folclore japonês dentro dessa categorização, como Shitakiri Suzume (“O Pardalzinho Que Teve a Língua Cortada”) e Omusubi Kororin (“O Bolinho de Arroz Que Rolava”), entre outras, cuja temática gira em torno de um velhinho bondoso que consegue obter bens e é invejado por um velho mau, que sempre acaba castigado ao final da narrativa.

Às vezes um mesmo mukashi banashi pode pertencer a mais de uma classificação. Por exemplo, o conto Hanasaka Jiisan (“O Velhinho Que Fazia Florescer”) pode tanto ser classificado na subcategoria 2.4.1., como também na subcategoria 2.6. (narrativas sobre agradecimentos de animais), visto que todas as recompensas que o velhinho bondoso recebe vêm de seu cãozinho que havia sido morto pelo velho invejoso.

 

Saru Kani Kassen (“A Batalha Entre o Macaco e o Caranguejo”)

É um dôbutsu mukashi banashi (categoria 1) e, como sugere o próprio título, pertence à subcategoria 1.2., por retratar a contenda entre esses dois animais. Comparado às narrativas ocidentais, apresenta estrutura de fábula devido ao aspecto moralizante, com o macaco sendo castigado ao final.

 


 

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