Lídia Ivasa – Formação e experiência com tradução literária

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Formação e experiência com tradução literária

Agradeço a oportunidade de falar um pouco sobre minha experiência com tradução. Vou relatar minha trajetória sob três aspectos: a tradução literária, a tradução de mangás e a pesquisa sobre tradução. Faço também a ressalva de que esta é a minha opinião, baseada em minha vivência. Os leitores podem notar, pelos relatos já publicados, que cada tradutor possui sua própria experiência e perspectiva sobre o assunto.

Optei pelo bacharelado em Letras na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) por causa da habilitação para tradutor português e japonês. O currículo me pareceu interessante para iniciar nesta área, oferecendo conhecimentos básicos sobre Terminologia, Lexicologia e Lexicografia, Sintaxe do texto e CAT tools, para citar alguns exemplos, e que se mostrariam úteis no processo tradutório. Além, é claro, dos estudos em Língua, Literatura e Cultura Japonesa e da prática de tradução e versão. Nos dois últimos semestres, o curso ofereceu as disciplinas de Estágio supervisionado de tradução do japonês I e II, em que o aluno traduz textos mais longos com a supervisão de um professor. Foi nesse contexto que eu e minhas colegas, Clicie Araujo e Maria Luísa Vanik Pinto, traduzimos A gata, um homem e duas mulheres, de Jun’ichiro Tanizaki. A tradução contou com supervisão dos professores Tomoko Gaudioso e Andrei Cunha. Foi minha primeira experiência com a tradução de um texto mais longo, pois o objeto de tradução até então foram contos, legendas de vídeos curtos e artigos científicos. Nas reuniões semanais para cotejar o romance discutimos as diferenças culturais e estilísticas que o texto apresentava. Um exemplo que posso citar é a voz narrativa e os pensamentos das personagens. Em japonês, a separação entre as duas vozes é inexistente, elas estão no mesmo parágrafo. Na tradução, utilizamos o itálico para distingui-las.

 

© Estação Liberdade / Foto: Lídia Ivasa

 

A tradução das obras A ponte flutuante dos sonhos e Retrato de Shunkin, também de Jun’ichiro Tanizaki, foi um trabalho conjunto com Andrei Cunha e Ariel Oliveira, após ter concluído a graduação. O curioso é que este projeto reuniu dois textos escritos em momentos muito diferentes da vida do autor. Em A ponte flutuante dos sonhos, temos a evidente referência a Yume no ukihashi, último tomo de Genji monogatari, de Murasaki Shikibu. Essa influência provavelmente se deve ao trabalho de Tanizaki quando traduziu a obra do japonês clássico para o japonês moderno. Quanto a Retrato de Shunkin, o texto possui muitas referências ao mundo da música tradicional japonesa, como os instrumentos koto e shamisen. Felizmente, temos escolas de música tradicional japonesa no Brasil, o que facilitou bastante a pesquisa sobre o assunto.

O que posso afirmar com base em minha prática de tradução é que nem sempre o tradutor conseguirá incluir todas as possibilidades semânticas contidas no texto em japonês. Cito como exemplo os ideogramas. Geralmente os nomes das personagens são grafados em ideogramas e o autor pode incluir um significado especial para o nome, como se descrevesse a natureza da personagem. São raros os casos em que se explica o significado do nome – apenas se tiver importância para o enredo da história. Em Retrato de Shunkin, Shunkin (春琴) é um nome artístico composto por parte do nome de seu professor, Harumatsu (春松, em que haru também pode ser lido como shun) e do nome de nascimento da personagem, Koto (琴, também pode ser lido como kin e refere-se ao instrumento musical que a personagem toca). Era necessário explicar por que Koto passou a ser chamada de Shunkin ao longo da história, portanto inserimos uma nota de rodapé. Na maioria dos casos, o significado desses ideogramas é perdido, pois se faz a transliteração para o alfabeto romano. Por outro lado, explicar os ideogramas de todos os nomes interromperia a narrativa, desviando a atenção do leitor. É um equilíbrio delicado, devo dizer, pois não são todos os leitores que apreciam uma tradução excessivamente explicativa.

 

 


 

Lídia Ivasa

Bacharel em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e mestre em Literatura Japonesa pela Universidade de São Paulo (USP). Tem interesse pelas áreas de tradução, literatura, cultura e história do Japão. Atualmente trabalha como tradutora em japonês-português.

 


 

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