Drik Sada – Tradução Técnica versus Tradução de Mangás

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Antes de entrar no mercado de mangás no Brasil, trabalhei com tradução técnica por mais de uma década. Nela, é exigida a precisão das informações, a simplificação do texto e a sistematização da terminologia. Remove-se elementos linguísticos da cultura japonesa, que sejam dispensáveis para a tecnicalidade do texto, e substitui-se por outros, que facilitam a leitura do usuário brasileiro.

 

 

Por sua vez, nas traduções de mangás, precisei buscar outros mecanismos de linguagem. O trabalho era o de recontar a história do autor, óbvio; mas quem diria que haveria tantas metas a cumprir, até chegar a isso… É preciso ser fiel ao texto sem ser literal, saber quando transgredir o original, escolher palavras condizentes com a faixa etária do mangá, prestar atenção para que a escolha case com o enredo que, muitas vezes, nem está concluído, avaliar o que deve ser adaptado ou não, quebrar a cabeça para achar uma piada ou um trocadilho equivalente, acolher as eventuais restrições impostas pela licenciante ou pela editora brasileira… Se começasse a enumerar todos os pequenos obstáculos que tornam a tradução de um mangá muito mais do que recontar uma história, não teria fim. E, se eu fosse entrar nas particularidades de cada um dos mais de 120 títulos com os quais já trabalhei, precisaria começar um livro.

 

 

Enquanto a tradução técnica me exigia alta precisão, a tradução de mangás me obrigou a lidar com toda uma gama de imprecisões. Imprecisões essas que, justamente, são a margem onde o tradutor encontra a liberdade para criar, de temperar a tradução, deixando-o “à moda da casa”.

Costumo comparar o traduzir com cozinhar. Dez podem fritar um ovo, e os dez sairão diferentes. Assim é com a tradução de mangás.

A analogia serve também para diferenciar a tradução amadora da profissional. Quando cozinhamos para nós mesmos, deixamos tudo ao nosso gosto. Mas, quem cozinha profissionalmente, sabe que não há prato perfeito, há apenas o tempero adequado para cada paladar. O tradutor profissional é aquele que domina a arte de fazer o ovo cozido para cada gosto, da gema dura ao ovo mollet. Saber temperar ao gosto do cliente é o segredo da tradução dos mangás.

E, essa não é uma tarefa fácil. É desafiante, arriscada, o medo de errar é constante. Mas, é nessas horas que lembro do meu norte e escolho sempre a alternativa que fará o meu cliente sorrir.

 


 

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